No Concílio Vaticano II o magno problema do comunismo não fora ventilado e constava até, a boca pequena, que se proibira qualquer referência ao tema
APROXIMAVA-SE o fim da segunda Sessão do Concílio Vaticano II, que fora aberto em 11 de outubro de 1962 por João XXIII. Nesse Concílio, que se quis pastoral e não dogmático (ou seja, que se reuniu não para definir verdades da Fé, mas para dar soluções práticas às grandes questões que afligem a Igreja em nossos dias), o magno problema do comunismo não fora até então ventilado. Constava até, à boca pequena, que se proibira qualquer referência ao tema, como condição imposta pelo governo soviético para a participação, no Concílio, de observadores da igreja cismática russa.
No entanto, o problema não podia ser ignorado. O comunismo é por excelência o inimigo que a Igreja tem que enfrentar aquém e além cortina de ferro. É ele o adversário mais radical no plano doutrinário, mais bem articulado e mais eficaz no plano tático, e o mais universal com que a Igreja se tenha defrontado em seus dois mil anos de História.
Entretanto, depois de uma fase de perseguição atroz, os comunistas se deram conta de que lhes era necessário arrefecer a oposição dos católicos, para que a implantação do regime coletivista se tornasse mais durável nos países em que existia, e para que ele conseguisse estender-se ao resto do mundo.
O primeiro oferecimento de colaboração aos católicos foi o famoso discurso pela Rádio Paris, em 17 de abril de 1936, no qual o líder comunista francês Maurice Thorez lançou a “politique de la main tendue”, isto é, a política da mão estendida aos católicos.
Na época pré-conciliar, a oposição existente entre a Igreja e o Comunismo estava bastante clara em todos os espíritos. Essa oposição não era apenas teórica: quando o líder comunista francês Maurice Thorez lançou a chamada “política da mão estendida” em relação aos católicos, o Papa Pio XI reagiu energicamente, alertando os fiéis para a falácia dessa manobra
Pio XI reagiu energicamente a essa proposta, alertando os fiéis para a falácia dessa manobra na célebre alocução Siamo ancora, de 12 de maio do mesmo ano. E um ano mais tarde consagrava toda uma Encíclica para tratar do tema (Divini Redemptoris, de 19 de março de 1937). Nesta, dizia peremptoriamente:
“Assim, em alguns lugares, [os chefes comunistas] mantendo-se firmes em seus perversos princípios, convidam os católicos a colaborar com eles, no chamado campo humanitário e caritativo, propondo por vezes coisas em tudo até conformes ao espírito cristão e à doutrina da Igreja. Em outras partes, sua hipocrisia vai ao ponto de fazer acreditar que o comunismo, em países de maior fé ou de maior cultura, tomará feição mais branda, não impedirá o culto religioso e respeitar a liberdade de consciência. Mais. Alguns há que, referindo-se a certas mudanças introduzidas recentemente na legislação soviética, daí concluem que o comunismo está prestes a abandonar o seu programa de luta contra Deus.
“Velai, Veneráveis Irmãos, por que se não deixem iludir os fiéis. Intrinsecamente mau é o comunismo, e não se pode admitir, em campo algum, a colaboração recíproca, por parte de quem quer que pretenda salvar a civilização cristã. E se alguém, induzido em erro, cooperasse para a vitória do comunismo em seu país, seria o primeiro a cair como vítima do próprio erro” (1).
(1) Vozes, Petrópolis, Documentos Pontifícios, fasc. 1, 6ª ed., 1959, p. 30.
As enérgicas palavras de Pio XI contribuíram para circunscrever em larga medida essa incipiente infiltração comunista no campo católico, que teve de prosseguir à socapa, incubada nos meios progressistas que sorrateiramente iam ganhando terreno.
Ao fim da II Guerra Mundial, com o clima colaboracionista criado pela Conferência de Yalta, o problema renasceria, e de modo ainda mais virulento. Em 1949, Pio XII aprovou o famoso decreto da Sagrada Congregação do Santo Ofício fulminando mais uma vez toda colaboração com os comunistas, sob pena de excomunhão.
Em 1958 morre Pio XII e é eleito João XXIII. A crise progressista já ia fundo dentro da Igreja, arrefecendo no espírito de incontáveis fiéis a certeza da incompatibilidade fundamental entre a Religião Católica e o comunismo.
Às vésperas do II Concílio Vaticano, nos países dominados pela seita vermelha, os líderes desta começaram muito discretamente a alimentar as esperanças de um abrandamento da perseguição religiosa, caso os católicos deixassem de combater o regime.
Os primeiros sintomas desse degelo atraíram desde logo a atenção do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, que teve a oportunidade de discutir o problema com alguns Prelados por ocasião de sua ida a Roma, durante a primeira Sessão do Concílio. Concordavam eles em que não era lícito aos católicos deixar de combater o regime sócio-econômico do comunismo mediante a promessa da concessão de uma tal ou qual liberdade de culto. Achavam árduo, porém, demonstrar a tese.
Foi assim que surgiu o ensaio A liberdade da Igreja no Estado comunista, publicado pela primeira vez em “Catolicismo” (nº 152, de agosto de 1963). Com a elegância e simplicidade de estilo que o caracterizam, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira descreve o problema e demonstra, de modo irrefutável, que os católicos devem rejeitar todo acordo com os comunistas que implique na omissão de defender os Mandamentos da Lei de Deus. Ora, o 7º e o 10º fundamentam a propriedade privada. Portanto, nem mesmo a ameaça de recrudescimento da perseguição, ou de uma guerra mundial – com a conseqüente hecatombe termonuclear – poderia levar os católicos a abrirem mão dos princípios consubstanciados naqueles dois Mandamentos, que se opõem per diametrum ao coletivismo comunista.
Com o degelo em relação à Igreja promovido pelo comunismo internacional, muitos católicos se perguntavam se seria lícito barganhar a obrigação de combater o regime sócio-econômico vermelho pela concessão de uma tal ou qual liberdade de culto. No ensaio “A liberdade da Igreja no Estado comunista”, Plinio Corrêa de Oliveira responde pela negativa. Com a publicação do livro estabelece-se uma polêmica, de que tomam parte até revistas colaboracionistas de trás da Cortina de Ferro
O ensaio foi imediatamente traduzido para o espanhol, o francês, o inglês e o italiano, por iniciativa da Seção carioca da TFP. Uma distribuição dessas traduções aos 2.200 Padres Conciliares presentes em Roma, desde logo se impunha. Encarregou-se do serviço o secretariado que alguns diretores da TFP haviam instalado na Cidade Eterna por ocasião do Concílio (2).
(2) Cfr. “Catolicismo”, nº 157, janeiro de 1964.
Também pareceu oportuno distribuir o estudo do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira aos 450 jornalistas de todo o mundo que faziam a cobertura da Magna Assembléia, o que foi feito facilmente pelo secretariado, nos escritórios da Comissão das Comunicações sobre o Concílio, onde os referidos jornalistas se reuniam. É bem possível que esta distribuição tenha sido o veículo da ressonância que A liberdade da Igreja no Estado comunista encontrou atrás da cortina de ferro, como adiante se dirá (*).
(*) Nova distribuição de A liberdade da Igreja no Estado comunista, na versão ampliada pelo autor, foi promovida pelo secretariado da TFP em Roma, durante a terceira Sessão do Concílio. Por ocasião da visita de S.S. Paulo VI aos Estados Unidos, em novembro de 1979, a TFP norte-americana divulgou, em campanha de rua, as edições em inglês, polonês e vietnamita.
No dia 4 de janeiro de 1964, “Il Tempo”, o maior diário de Roma, estampa na íntegra o estudo do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, levantando no coração mesmo da Cristandade o problema que o Concílio parecia não querer considerar (**).
(**) A Constituição Pastoral Gaudium et Spes do Concílio Vaticano II, em nota de rodapé referente ao problema do ateísmo, cita a Encíclica Divini Redemptoris, de Pio XI, e mais alguns documentos do Magistério Pontifício que condenam, entre outros erros, também o comunismo. Esta nota de rodapé tem sido usada como argumento para a afirmação de que o Concílio não foi inteiramente omisso em matéria de condenação do comunismo. Não é aqui o lugar oportuno para tratar deste tema.
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Entrementes, A liberdade da Igreja no Estado comunista vai fazendo o seu caminho, e não apenas no Mundo Livre. A obra transpõe a cortina de ferro, onde o movimento “católico”-comunista Pax, da Polônia, a ataca violentamente, através de seus órgãos “Kierunki” (nº 8, de 1º-3-64) e “Zycie i Mysl” (nº 1/2, de 1964). Origina-se daí uma polêmica entre o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira e o jornalista Z. Czajkowski, membro destacado daquele movimento.
“Nossa discussão – afirma o “camarada” Czajkowski em um de seus artigos – suscitou grande interesse na Polônia, como testemunham, entre outras, as notícias e informações publicadas a respeito em outros periódicos poloneses, que aliás tomam a mesma atitude que eu com referência às suas teses”.
Essa polêmica tem desdobramentos internacionais, envolvendo a conhecida folha católica de Paris “L’Homme Nouveau” (de 3-5-64), favorável à obra, bem como o turbulento órgão comuno-progressista francês “Témoignage Chrétien” (nº 1035, de 1964). Por seu lado, a revista “Wiez”, de Varsóvia (nº 11/12, novembro/dezembro de 1964) publica um artigo que procura ser uma réplica ao estudo do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira.
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A tese não-colaboracionista de Plinio Corrêa de Oliveira foi calorosamente elogiada pela Santa Sé, em Carta da Sagrada Congregação dos Seminários e Universidades, assinada pelo Prefeito daquele Dicastério, o Cardeal Giuseppe Pizzardo, e pelo Secretário, Mons. Dino Staffa, que depois foi elevado ao cardinalato. Enquanto a polêmica ferve, o ensaio de Plinio Corrêa de Oliveira vai sendo difundido em muitos países (total de 38 edições, em 8 idiomas). No Brasil e em outras nações da América do Sul é ele propagado em vitoriosas campanhas de rua.
Em maio de 1964, ainda uma vez pelas páginas de “Catolicismo” (nº 161), o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira publica uma edição ampliada desse ensaio, em que desenvolve mais largamente alguns argumentos. O autor atendia assim a sugestões de diversas personalidades que haviam lido o trabalho em sua primeira versão e manifestado vivo interesse por ele.
Por ocasião da 10ª edição brasileira da obra, em agosto de 1974, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira muda-lhe o título para tornar mais patente a tese de que trata: Acordo com o regime comunista: para a Igreja, esperança ou autodemolição?
Traduzida em oito línguas (alemão, espanhol, francês, húngaro, inglês, italiano, polonês e vietnamita), a obra tem 38 edições, num total de 171 mil xemplares. Além disto, seu texto é reproduzido na íntegra em 39 jornais ou revistas de treze países.
Resenhas e comentários são estampados em um número incontável de publicações.
É escusado dizer que nesse gigantesco esforço de difusão tiveram papel saliente as TFPs e entidades afins do mundo inteiro.
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Entretanto, estava reservada para A liberdade da Igreja no Estado comunista uma consagradora aprovação de importante órgão da Santa Sé. A 2 de dezembro de 1964, a Sagrada Congregação dos Seminários e Universidades (hoje Sagrada Congregação para a Educação Católica) envia carta ao Bispo de Campos, D. Antonio de Castro Mayer, em que louva o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, “merecidamente célebre pela sua ciência filosófica, histórica e sociológica”, augurando “a mais larga difusão ao denso opúsculo, que é um eco fidelíssimo de todos os Documentos do supremo Magistério da Igreja, inclusive as luminosas Encíclicas ‘Mater et Magistra’, de João XXIII, e ‘Ecclesiam Suam’, de Paulo VI”.
A carta, assinada pelo Prefeito daquele Sagrado Dicastério, Cardeal Giuseppe Pizzardo, e referendada pelo Secretário, Monsenhor Dino Staffa, depois Cardeal, constitui valioso testemunho do acerto com que o autor demonstra a delicada tese, e da fidelidade de sua doutrina à ortodoxia católica.
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